
VAZIO
Como pode alguém se queixar de sentir um vazio? Por que se atribui essa palavra à essa sensação. Melhor seria dizer, ‘sinto-me cheio’. Não é a falta de opções que nos traz o vazio. É o volume enorme delas e a ausência de atração por alguma delas especificamente que nos faz sentir-nos vazios.
O vazio é como a poluição sonora ou visual. Você ouve tantos sons, você vê tantas imagens, que não é capaz de se focar em alguma, tão desnorteado se sente, tão incapaz de reconhecer a individualidade de cada objeto.
O vazio interno é semelhante ao externo. Numa danceteria, cheia de luzes, cores, pessoas, músicas e barulhos, pode-se sentir se desenvolver essa sensação. Não é à toa que muitas pessoas não suportam esse tipo de local.
O vazio interno é uma barulheira enorme dentro da mente. No entanto, diferentemente da danceteria, não se pode apenas retirar-se do local. Há que se conseguir lá dentro, um cantinho silencioso, no qual não haja chances de dispersão.
É realmente incorreto o uso da palavra ‘vazio’, quando na verdade se quer expressar desinteresse. E as pessoas, tentando ajudar, como se de fato o individuo estivesse carente de opções, começam a sugerir: ‘por que você não faz aula de pintura?’, ‘por que você não pratica algum esporte’, e coisas assim.
O indivíduo já está estressado de tanto estudar as possibilidades, já até passou por sua mente aquelas idéias que as pessoas lhe estão sugerindo; e se sente ainda mais pressionado, pois ainda não encontrou um interesse e é obrigado a fazer escolhas.
Estou desinteressado. Tudo parece vazio, todo esse volume de coisas ao meu redor parece não ter valor. Isto sim é a expressão mais apropriada da sensação daquele que se encontra no vazio.
Engajar-se em atividades mesmo sem a devida atração parece hipocrisia e traição. Hipocrisia, pois é um movimento falso. Traição, pois não estamos com nossa alma ali.
Ainda assim, parece ser esse o processo de saída do ‘vazio’, da mesma forma que um carro sem bateria, pega no tranco. Ele se põe a andar e ao se pôr a andar, anda. Talvez por isso nos centros de tratamento mental sugiram-se terapias ocupacionais. Faça. Simplesmente faça. Assim você vai se aquietar.
Então o desinteressado, pincela com aquarela, molda argila e pensa: ‘como isso poderá fazer com que eu progrida na vida!’ Ou talvez, um terapeuta bem paternalista diga: ‘muito bem, olha que bonito está ficando’.
Crianças enjoadas, mimadas, mal educadas, esses são os que sofrem do vazio.
E de onde vem o contentamento daqueles que nunca sentiram o vazio? Não sei, talvez da mediocridade. Talvez de uma humilde satisfação com a variedade, que não lhes causa dúvidas na escolha. Qualquer coisa serve, tudo tem o seu valor.
O vazio pode apresentar-se numa fase da vida, ou mais de uma vez, ou até mesmo acompanhar um individuo por toda a sua existência, com breves intervalos nos quais a ilusão parece trazer algum significado para uma escolha feita.
Não pode entender de vazio aquele que nunca passou pelo vazio. É uma compreensão que exige uma experiência pessoal. Pode-se fazer uma idéia, assim como um homem imagine o que seja para a mulher um parto. Mas ele não sentiu as contrações, ele não vivenciou a experiência, viu de fora.
É assim que aqueles que são vítimas do vazio percebem os outros. Vocês estão me vendo de fora, vocês não experimentaram essa dor e ficam me dizendo pra respirar, empurrar, enfim, fazer coisas que obviamente já passaram pela minha cabeça.
Até mesmo se houvesse uma preferência, uma atração, aquele que sente o vazio levaria em consideração o esforço e o tempo necessário para obter aquilo que deseja, o que o desestimularia a fazer esforços rumo à conquista de algo que no final das contas, nem o apaixona tanto.
O vazio pregado na meditação, o vazio dos budistas e dos yogues, este sim é invejável e autêntico. Silêncio. Paz. Acabou a barulheira. Não há esforços. Só se ouve a doce voz do coração. A solidão acaba e começa a união com o cosmos, como o Todo, com a vida.
Ah, como eu gostaria de sentir esse vazio...
Como pode alguém se queixar de sentir um vazio? Por que se atribui essa palavra à essa sensação. Melhor seria dizer, ‘sinto-me cheio’. Não é a falta de opções que nos traz o vazio. É o volume enorme delas e a ausência de atração por alguma delas especificamente que nos faz sentir-nos vazios.
O vazio é como a poluição sonora ou visual. Você ouve tantos sons, você vê tantas imagens, que não é capaz de se focar em alguma, tão desnorteado se sente, tão incapaz de reconhecer a individualidade de cada objeto.
O vazio interno é semelhante ao externo. Numa danceteria, cheia de luzes, cores, pessoas, músicas e barulhos, pode-se sentir se desenvolver essa sensação. Não é à toa que muitas pessoas não suportam esse tipo de local.
O vazio interno é uma barulheira enorme dentro da mente. No entanto, diferentemente da danceteria, não se pode apenas retirar-se do local. Há que se conseguir lá dentro, um cantinho silencioso, no qual não haja chances de dispersão.
É realmente incorreto o uso da palavra ‘vazio’, quando na verdade se quer expressar desinteresse. E as pessoas, tentando ajudar, como se de fato o individuo estivesse carente de opções, começam a sugerir: ‘por que você não faz aula de pintura?’, ‘por que você não pratica algum esporte’, e coisas assim.
O indivíduo já está estressado de tanto estudar as possibilidades, já até passou por sua mente aquelas idéias que as pessoas lhe estão sugerindo; e se sente ainda mais pressionado, pois ainda não encontrou um interesse e é obrigado a fazer escolhas.
Estou desinteressado. Tudo parece vazio, todo esse volume de coisas ao meu redor parece não ter valor. Isto sim é a expressão mais apropriada da sensação daquele que se encontra no vazio.
Engajar-se em atividades mesmo sem a devida atração parece hipocrisia e traição. Hipocrisia, pois é um movimento falso. Traição, pois não estamos com nossa alma ali.
Ainda assim, parece ser esse o processo de saída do ‘vazio’, da mesma forma que um carro sem bateria, pega no tranco. Ele se põe a andar e ao se pôr a andar, anda. Talvez por isso nos centros de tratamento mental sugiram-se terapias ocupacionais. Faça. Simplesmente faça. Assim você vai se aquietar.
Então o desinteressado, pincela com aquarela, molda argila e pensa: ‘como isso poderá fazer com que eu progrida na vida!’ Ou talvez, um terapeuta bem paternalista diga: ‘muito bem, olha que bonito está ficando’.
Crianças enjoadas, mimadas, mal educadas, esses são os que sofrem do vazio.
E de onde vem o contentamento daqueles que nunca sentiram o vazio? Não sei, talvez da mediocridade. Talvez de uma humilde satisfação com a variedade, que não lhes causa dúvidas na escolha. Qualquer coisa serve, tudo tem o seu valor.
O vazio pode apresentar-se numa fase da vida, ou mais de uma vez, ou até mesmo acompanhar um individuo por toda a sua existência, com breves intervalos nos quais a ilusão parece trazer algum significado para uma escolha feita.
Não pode entender de vazio aquele que nunca passou pelo vazio. É uma compreensão que exige uma experiência pessoal. Pode-se fazer uma idéia, assim como um homem imagine o que seja para a mulher um parto. Mas ele não sentiu as contrações, ele não vivenciou a experiência, viu de fora.
É assim que aqueles que são vítimas do vazio percebem os outros. Vocês estão me vendo de fora, vocês não experimentaram essa dor e ficam me dizendo pra respirar, empurrar, enfim, fazer coisas que obviamente já passaram pela minha cabeça.
Até mesmo se houvesse uma preferência, uma atração, aquele que sente o vazio levaria em consideração o esforço e o tempo necessário para obter aquilo que deseja, o que o desestimularia a fazer esforços rumo à conquista de algo que no final das contas, nem o apaixona tanto.
O vazio pregado na meditação, o vazio dos budistas e dos yogues, este sim é invejável e autêntico. Silêncio. Paz. Acabou a barulheira. Não há esforços. Só se ouve a doce voz do coração. A solidão acaba e começa a união com o cosmos, como o Todo, com a vida.
Ah, como eu gostaria de sentir esse vazio...
"Maria Callas Da Fonseca"